quinta-feira, 22 de maio de 2014

Guia do Estudante

Para os que vão prestar vestibular, sugiro o sitehttp://guiadoestudante.abril.com.br/

Diferença entre trovador e jogral

O trovador é um poeta que, além de escrever em versos, também compõe a música em que eles devem ser cantados. E a poesia que escreve é para ser ouvida, não para ser lida. Diante de que público? Do das cortes. O trovador anda de core em corte, a sua poesia divulga-se rapidamente, embora em círculos sociais fechados. Mas quem tem papel muito mais activo em tal divulgação é o jogral, geralmente de baixa condição no contexto da sociedade em que circula, sendo qualificações bastantes para ele o saber cantar e tocar bem, embora pudesse ser preferido o que possuísse outras artes para chamar a atenção do público. Quais? As que, como diríamos hoje, são mais próprias dos artistas de circo.

O trovador, geralmente da classe nobre, podia empregar um jogral para divulgar as suas composições (...). O jogral podia, no entanto, à força de talento, promover-se a trovador, mas as represálias de casta eram, por vezes terríveis. E o trovador, em caso de penúria, corria o risco de despromover-se a jogral, já que, se Por necessidade fosse obrigado a percorrer as cortes, pelos benefícios daí derivados, a sociedade escalonada em apertada rede de hierarquias tornava-o em fidalgo marginalizado, caído em desgraça, compelido a descer, sem mais remédio, alguns degraus da íngreme e ingrata escada social.
Alexandre Pinheiro Torres, «Introdução» à Antologia da Poesia Trovadoresca Galego-Portuguesa, 2ª, ed.. Lello. Porto, 1987.

http://auladeliteraturaportuguesa.blogspot.com.br/2007/03/trovadores-e-jograis.html

terça-feira, 6 de maio de 2014

Outro exemplo de intertextualidade


Texto bíblico:

"Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei como o sino que ressoa ou como o prato que retine. Ainda que eu tenha o dom de profecia e saiba todos os mistérios e todo o conhecimento, e tenha uma fé capaz de mover montanhas, mas não tiver amor, nada serei. Ainda que eu dê aos pobres tudo o que possuo e entregue o meu corpo para ser queimado, mas não tiver amor, nada disso me valerá. O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria, não se orgulha. Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira facilmente, não guarda rancor. O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor nunca perece; mas as profecias desaparecerão, as línguas cessarão, o conhecimento passará. Pois em parte conhecemos e em parte profetizamos; quando, porém, vier o que é perfeito, o que é imperfeito desaparecerá. Quando eu era menino, falava como menino, pensava como menino e raciocinava como menino. Quando me tornei homem, deixei para trás as coisas de menino. Agora, pois, vemos apenas um reflexo obscuro, como em espelho; mas, então, veremos face a face. Agora conheço em parte; então, conhecerei plenamente, da mesma forma como sou plenamente conhecido. Assim, permanecem agora estes três: a fé, a esperança e o amor. O maior deles, porém, é o amor." (1 Coríntios 13:1-13)


Soneto de Camões:

Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;
É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder;
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?


Letra da música "Monte Castelo", do Legião Urbana:

Ainda que eu falasse
A língua dos homens
E falasse a língua dos anjos
Sem amor eu nada seria

É só o amor! É só o amor
Que conhece o que é verdade
O amor é bom, não quer o mal
Não sente inveja ou se envaidece

O amor é o fogo que arde sem se ver
É ferida que dói e não se sente
É um contentamento descontente
É dor que desatina sem doer

Ainda que eu falasse
A língua dos homens
E falasse a língua dos anjos
Sem amor eu nada seria

É um não querer mais que bem querer
É solitário andar por entre a gente
É um não contentar-se de contente
É cuidar que se ganha em se perder

É um estar-se preso por vontade
É servir a quem vence, o vencedor
É um ter com quem nos mata a lealdade
Tão contrário a si é o mesmo amor

Estou acordado e todos dormem
Todos dormem, todos dormem
Agora vejo em parte
Mas então veremos face a face

É só o amor! É só o amor
Que conhece o que é verdade

Ainda que eu falasse
A língua dos homens
E falasse a língua dos anjos
Sem amor eu nada seria


Assistam ao vídeo!




Estudem!!!





TEXTO PARA PROVA!

TROVADORISMO

A primeira época da história da Literatura Portuguesa inicia-se em 1198 (ou 1189), quando o trovador Paio Soares de Taveirós dedica uma cantiga de amor e escárnio a Maria Pais Ribeiro, cognominada A Ribeirinha, favorita de D. Sancho I, - e finda em 1418, quando D. Duarte nomeia Fernão Lopes para o cargo de Guarda-Mor da Torre do Tombo.

A Poesia

De origem ainda obscura, o lirismo trovadoresco instalou-se na Península Ibérica por influência provençal. Dentro do trovadorismo português, o ponto mais alto do processo sentimental situava-se antes de a dama atender aos reclamos do apaixonado. Duas eram as espécies de poesia trovadoresca: a lírico-amorosa, expressa em duas formas, a cantiga de amor e a cantiga de amigo; e a satírica, expressa na cantiga de escárnio e de maldizer. O poema recebia o nome de "cantiga" (ou ainda de "canção" e "cantar") pelo fato de o lirismo medieval associar-se intimamente com a música: a poesia era cantada, ou entoada, e instrumentada. Letra e pauta musical andavam juntas, de molde a formar um corpo único e indissolúvel. Daí se compreender que o texto sozinho, como o temos hoje, apenas oferece uma incompleta e pálida imagem do que seriam as cantigas quando cantadas ao som do instrumento, ou seja, apoiadas na pauta musical. O acompanhamento musical fazia-se com instrumentos de corda, sopro e percussão (viola, alaúde, flauta, adufe, pandeiro, etc.). O espólio trovadoresco conserva-se em "cancioneiros", vale dizer, coletâneas de cantigas, das quais os mais valiosos são o Cancioneiro da Ajuda, o Cancioneiro da Vaticana e o Cancioneiro da Biblioteca Nacional. Recebiam o título de trovadores os poetas que compunham, cantavam e instrumentavam suas próprias cantigas. Jogral chamava-se o bobo da Corte, o mímico, o bailarino, e às vezes também compunha. Segrel era o trovador profissional e, via de regra, andarilho. Menestrel era o músico. O idioma empregado era o galaico(galeco)-português.

Paio Soares de Taveirós

A Cantiga da Ribeirinha foi escrita por Paio Soares de Taveirós para sua amada Maria Ribeira. Ela narra a história de um amor não correspondido. Há dúvidas se a poesia foi escrita em 1189 ou 1198. Está registrada no Cancioneiro da Ajuda. A língua portuguesa originou-se do latim e o texto é escrito em galego-português. 


No mundo non me sei parelha1,
mentre2 me for' como me vai,
ca3 já moiro por vós - e ai!
mia senhor4 branca e vermelha,
queredes que vos retraia
quando vos eu vi en saia!
Mau dia me levantei,
que vos enton non vi fea!
E, mia senhor, dês aquel di’, ai!
me foi a mi mui mal,
e vós, filha de don Paai
Moniz, e ben vos semelha5
d'haver eu por vos guarvaia,
pois eu, mia senhor, d'alfaia
nunca de vos houve nen hei
valia d'ua correa.


1 parelha = igual, semelhante.
2 mentre = enquanto, entrementes. Essa forma arcaizou-se, isto é, caiu em desuso, mas o espanhol manteve a forma antiga mientras.
3 ca = pois, porque. Enquanto ca também se arcaizou, o francês manteve car até hoje, com o mesmo significado.
4 senhor = senhora. Por essa época, usava-se na poesia a palavra "senhor" referindo-se indistintamente ao homem e à mulher.
5 semelha = parece.

O Trovador nos dá a impressão de encobrir setas embebidas em sarcasmo ou despeito. Por essa causa, e pelo fato de o texto apresentar várias dúvidas aos filólogos, os estudiosos continuam a discordar quanto à interpretação da cantiga. As maiores dificuldades estão nos pontos:
1 - "Branca e vermelha", dependendo da posição da vírgula, pode significar a alvura e o rosado da pele feminina (ou a cor ruiva de seus cabelos) ou a cor da "guarvaia", "vestuário de corte e de luxo, provavelmente de cor escarlate".
2 - "Retraia" - Do verbo "retraer" que pode ter três significados: a) "retratar", "descrever", "relatar"; b) "afastar-se de", “retirar-se de”, "desvirar-se de", "recuar"; c) "desistir de", "renunciar a".
3 - "En saia!" - significa: a) "estar sem manto", "ser vista na intimidade", ou b) "estar de luto".
4 - "Filha de Don Paai / Muniz" - a palavra "filha" tem sido considerada: a) substantivo ou b) forma verbal, do verbo filhar, que significa "tomar de presente", "apropriar-se".
5- "por vós" - significa a) "por intermédio de vós", ou b) "por amor de vós", "para vós", ou c) "em troca de vós", "em substituição da vossa pessoa".

O caráter lastimoso, sobretudo dos primeiros versos, evidencia desde logo que trata dum cantar de amor. Mas a indiscrição do trovador ao revelar que a dama se lhe mostrara "en saia" e a alusão à "guarvaia" (através da qual , o apaixonado parece recriminar à dona , ainda que veladamente , o seu desejo de ser paga pelos favores concedidos) permitem supor um à-vontade próximo da ironia ou do desrespeito que, além de patentear o grau de intimidade entre o trovador e a dama , não se compadece com as estritas normas do amor cortês . Este, postulava o máximo de subserviência e veneração , e o emprego duma linguagem sutil que antes disfarçasse que escancarasse os conflitos sentimentais do trovador . Em suma, seria um escárnio de amor.

Uma interpretação...
Os 3 primeiros versos, de sentido transparente, contêm o lamento passional do trovador: "não conheço ninguém no mundo igual por vós - ai!". Os três versos seguintes possivelmente expressam algo como: "minha senhora alva e rosada, quereis que vós descreva quando vos vi na intimidade!"; ou "minha senhora alva e rosada quereis que vós lembre que já vos vi na intimidade?". E o final da cobra (estrofe) diria: "mal dia aquele (em que vos vi sem manto), pois vi que não sois feia". A segunda cobra encerraria o seguinte: "e, minha senhora, desde aquele dia, ai!, venho sofrendo dum grande mal, enquanto vós, filha de Don Paio Moniz, julgais forçosos que eu vos cubra com a "guarvaia" (ou:"que vos ofereça uma "guarvaia" para que vós cubrais as formas belas que entrevi quando estava sem manto") , eu, minha senhora, de vós nunca recebi a coisa mais insignificante".



Fonte: Massaud Moisés, renomado professor brasileiro e especialista em Literatura Portuguesa e Brasileira, no livro A literatura portuguesa através dos textos. SP: Ed. Cultrix, 1999.