terça-feira, 8 de novembro de 2011

Poema "Velho Negro", de Agostinho Gomes

Velho negro
Agostinho Neto
1948

Vendido
e transportado nas galeras
vergastado pelos homens
linchado nas grandes cidades
esbulhado até ao ultimo tostão
humilhado até ao pó
sempre sempre vencido

É forçado a obedecer
a Deus e aos homens
perdeu-se

Perdeu a pátria
e a noção de ser

Reduzido a farrapo
macaquearam seus gestos e a sua alma
diferente

Velho farrapo
negro
perdido no tempo
e dividido no espaço!

Ao passar de tanga
com o espírito bem escondido
no silencio das frases côncavas
murmuram eles:
pobre negro!

E os poetas dizem que são seus irmãos.



Vocabulário:

Esbulhado: Privado de alguma coisa a que tinha direito; roubado.
Farrapo: pedaço de pano ou de papel usado, rasgado.
Frases côncavas: frases retraídas, de pessoa insegura.
Galera: antiga embarcação longa e de baixo bordo, movida a vela ou a remos.
Vergastado: açoitado


O autor:
António Agostinho Neto (Ícolo e Bengo, 17 de setembro de 1922 — Moscovo, 10 de setembro de 1979) foi um médico angolano, formado nas Universidades de Coimbra e de Lisboa, que em 1975 se tornou o primei-ro presidente de Angola até 1979. Em 1975-1976 foi-lhe atribuído o "Prémio Lenine da Paz".